quarta-feira, 24 de junho de 2015

CRÔNICA DO DIA: ELE SE FOI...

Há dias que trechos de uma música não saem da minha cabeça. Embora a letra não se relacione diretamente a experiência que eu estava vivendo, partes dela se encaixavam perfeitamente à situação.

"Não sei por que você se foi..."

É fato. Só sei que você se foi. Você teve que ir. Mas o porque eu não sei. Queria que estivesse aqui. Sempre vivemos distantes fisicamente. Também não sei porque. A vida quis assim. Mas nossos corações sempre foram unidos e afins, apesar da distância deste nosso país continental. A invenção de Graham Bell nos ajudou muito com isso. Nos entendíamos em poucas palavras. Você era o queridinho da família, o irmão mais velho, mais responsável, mais sério, o único que não foi criado acreditando em Papai Noel. Mas apesar disso, dentro dessa casca de praticidade, habitava um coração grandioso, generoso e extremamente amigo. Você sempre foi de poucas palavras e eu, sua irmã caçula, de muitas. Éramos complementares. Apesar da grande diferença de idade e de personalidade, nossa responsabilidade e seriedade diante dos fatos da vida, acabaram nos aproximando. Muito. Você do seu jeito mais sério e eu com o meu jeito mais expansivo.

"Quantas saudades eu senti..."

Quantas saudades eu estou sentindo neste momento e vou sentir sempre. Saudade da sua suave autoridade, que lhe garantia ser ouvido nas situações familiares mais espinhosas. Um dom só seu. Me lembro quando nossa mãe querida adoeceu gravemente. Parecia que não ia resistir e os médicos sugeriram uma transferência de hospital para tentar reverter o quadro. Nossos outros irmãos tiveram medo que ela não resistisse. Conversei com vários médicos e diante do que me disseram mais uma vez fiz uso da invenção do Graham Bell para conversar com você. Grande invenção o telefone! Sempre nos deixou tão perto... Expliquei a situação a você e falei das dúvidas dos nossos irmãos. Você foi taxativo: "Faça o que tem que fazer. Estou do seu lado. Se algo não sair como esperamos, teremos certeza que tentamos fazer o melhor". Pronto. Essa ordem foi suficiente para que eu agisse. Com a transferência, nossa mãe melhorou e após um mês internada, recebeu alta completamente curada. Apesar da distância física, eu não me sentia só. Você estava comigo. Sempre. De verdade.

"E aquele adeus não pude dar..."

Vencido pelas mazelas deste mundo terreno, você partiu. Foi tudo tão rápido. Tão ferozmente doloroso. E a distância não nos permitiu um último abraço, um último carinho, um último afago. 
"Estou tão cansado... Tão cansado...", me disse você na penúltima vez que nos falamos ao telefone. Não sei se foi a forma como disse, as reticências, as palavras implícitas que não chegaram a ser ditas, mas o meu coração apertou, doeu e um pressentimento tomou conta de mim. A hora estava chegando. Qualquer couraça se rompe e as lágrimas são inevitáveis nessa hora. Me mantive firme, tentei lhe dizer palavras de alento. Poucas. E, por fim, apenas "eu te amo muito". E recebi de volta a mesma frase dita de forma intensa e sentida: "eu também te amo muito". Ao desligar o telefone, desabei. Sozinha. Silenciosa. Bem ao seu estilo.
Cerca de duas horas depois dessa breve conversa, seu estado de saúde se agravou e eu achei que nunca mais nos falaríamos. Mas guerreiro como só meu irmão mais velho poderia ser, você resistiu por mais uns poucos dias e eu pude falar mais uma vez. Desta vez você só iria ouvir. Falar lhe exigia um grande esforço. Então falei eu. Mais uma vez. "Eu te amo, meu irmão. Estou ao seu lado. Estamos todos unidos em pensamento e no amor que sentimos. Te amo demais!" E num último esforço você disse, quase inaudível, rouco: "obrigado... Eu te amo..."

"Você marcou em minha vida. Viveu, morreu na minha história..."

Você foi um exemplo para todos nós. Não só fez parte da nossa história. Você marcou, você fez a diferença e o amor que sempre nos uniu nunca morrerá. Seguirá para sempre guardado dentro dos nossos corações e nas nossas mentes. 

"Gostava tanto de você..."

Eu GOSTO tanto de você! Muito! Para todo o sempre!










Meu irmão, meu amigo, em um momento feliz da minha vida, em que você pôde estar presente fisicamente.













(Referências à música "Gostava tanto de você", de E. Trindade, eternizada na voz de Tim Maia).